16.10.19

amores que transbordam

Amores que transbordam. Olho e caminho pelo mar procurando dentro de mim o mais profundo sentido da frase, repito ao vento “amores que transbordam” e uma longa pausa. Feito os canais da Agamenon? Ou as barragens de PIrapama? Ou rios após longas chuvas? Copos enchidos distraidamente? Toneis de óleo despejados a estibordo? Pelo que entendi, você quer amores como corpos de água pequenos, que tenham limites para que haja transgressões, acidentes, demonstrações de um afeto que não pode nunca ser infinito. Tem que acabar na beira, para então derramar uma gota, e outra, e logo ali se perder a razão.

Se eu pudesse escolher um amor, eu escolheria o mar. A maior força da natureza e, salvo algumas exceções, não se impõem em ninguém. Quase tudo aceita. Se derrama e recolhe com maestria, sem se exceder nem faltar. Eu escolheria um amor infinito onde nao pudesse demarcar limites, onde cada dia vivesse a possibilidade de uma nova profundidade, hoje me contentando com a Fossa das Marianas, amanha, quem sabe? Poderia molhar meus pés na estreita costa do Benim e você seria o mesmo mar do amanhecer da Bahia, regido pelos mesmos deuses e orixás e justo à todas as suas criaturas. Eu queria um amor justo. Feito roupa molhada na pele quando me entrego numa onda, sem saber. Imprevisível e doce, ainda que na palavra o gosto venha bem salgado. Não suportando areia e o imbróglio sem fim das ondas, me mudaria para o oceano dentro e viveria dos meus braços e pernas e da minha força e amor por você, e quando me cansasse, finalmente me entregando inteiramente até o último pedaço, me receberias de águas abertas, afundando até teu fundo, ocupando ainda mais espaço e causando em ti uma dor ainda mais líquida, e nem por isso transbordarias.

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