16.6.10

brad pitt

hoje eu to sem graça na vida real.

pensei num título duas vezes

penso, e penso bastante, pratico tanto o pensar quanto o respirar, pensando mil coisas por inspiração, desistindo milhares por expiração, penso, piro, paro, ação castradora de toda minha espontaneidade. natural é ser ignorante.

penso, logo desisto.

lerebi

me convém querer tudo, porque na falta de realização fico sempre com um pouco mais de nada. ando sempre três metros além de onde quero chegar, porque caso a preguiça bata, a correnteza pode me arrastar alguns metro para trás e eu terei todo tempo do mundo para flutuar na leveza do acaso. esses passos naturais de quem se deixou levar elevam aos lugares que a rotina jamais chegaria.

deixa ser.

3x no cartão

o que eu quero tem nome? existe? respira? ou ainda ta pra ser criado, com toda a mágica das roupas guardadas que nunca usamos esperando a ocasião especial que nunca chega? porque quando chega nunca e sempre são o que deveriam, e nunca bastam e sempre faltam mais do que alimentam. o preenchimento seguido de um vazio.

mais os juros.

junk-soul

ultimamente não me reconheço, e reconheço agora que já faz um certo tempo além de ultimamente.
coisas que engoli calada e digeri às forças, incorporando cada silêncio cheio como um tijolo a mais nessa parede invisível que instalou-se ao redor de mim, estendendo mãos aleatoriamente para quem grita de lá, assistindo de dentro ao transbordar pesado das coisas que ficaram presas comigo. a vontade bate no peito e volta, a realidade bate no muro "toc toc, tem gente?" não.
não me encontro mais em nenhuma das coisas que um dia despertaram sentimentos irreconhecíveis; minha máquina está parada há meses, os livros empoeirados e enfileirados, os filmes sem final at all e o papel sempre em branco, ainda que cheio de supostos traços meus, em branco;
as fotografias reveladas em branco, as linhas lidas deram branco, os filmes de telas brancas, todo esse branco e nenhuma paz. me afogo no leite denso de sensações que beiraram-me, e quem não sou boia no que quero ser, quem sou flutua com força dentro do sufoco, divisão de águas erradas que mergulharam em si.

bate no muro e volta, bate no vulto e mora.

mentira

fino véu de plástico transparente;
fisicamente inofensivo, emocionalmente muralha da china.

to com saudade de mim; não é vazio, é uma menina que foi dormir fora de casa e deixou um recado na mesa dizendo,


"saudade,
, volto logo"

reflexo


to na porta de casa, baqueteando com os dedos uma música cansada de ser trilha sonora de uma vida sem música, longa espera;
na janela dos olhos pisca uma estrela lá longe e reflete uma luz estrangeira; hoje as estrelas não falam minha língua, sinalizam; conto meus sinais até que formem uma constelação no corpo; sinto-me em casa sozinha; uma vez me disseram que morrer é não ser visto, vejo; no espelho todos os sinais de todas as estrelas e a luz que vem de fora; escuro preto como a morte.
to na porta do corpo, na porta da porta, na janela da janela, na luz da luz dos olhos dela.

12.6.10

do baú dos sonhos



tinha dado por perdido, mas acho que hoje é o dia ideal para ser surpeendido, não é?

10.6.10

cactus e hormônios

o ser humano é egoísta, medroso. sendo então movido pelo medo onipresente da solidão, ele vai em busca de um amor para ama-lo de volta;
alguém que o deixe naturalmente a vontade para ser o que é, alguém que esquente seu coração nos momentos de saudade, que transforme a ausência em mágica espera; é isso mesmo, a gente ama para preencher.
claro, vai muito além disso, muito além de qualquer coisa que eu possa explicar com palavras, se fosse apenas passatempo eu amaria até meu cactus, porque ele me ocupa, ele me obriga a agua-lo de 15 em 15 dias e verificar se o sol está bom. vai muito além de qualquer coisa que uma frase de efeito possa descrever, ou a medicina com todos os seus hormônios venha a explicar; eu acho que o amor é uma manifestação divina, um evento sobrenatural, além.
e eu te amo da forma mais pura, da forma mais sincera, sem pedir nada em troca, porque ainda que troquemos tantas coisas, meu coração é uma pedra de gelo incapaz de sentir teus carinhos, incapaz de derreter com teu quentinho, eu realmente estou dando sem receber, simplesmente porque eu morreria de fome pra que não te faltasse comida, eu te deixaria comer tudo de mim para morrer feliz e viver em você.

sempre admirei os amores não-correspondidos pela beleza do sofrimento escolhido, o amor puro e singular.

iazul

eu já fiz muita coisa errada na vida, errei tentando acertar, como todos, e algumas vezes errei pelo prazer da dor alheia, fiz o mal puro e simples.
já fui infiel com namoradas, desleal com amigos, já menti coisas absurdas, justifiquei muito meio pelo fim... não importa a qualidade das minhas péssimas ações, nem a intensidade, eu sempre paguei calada no final; já fiquei sem dormir simplesmente por não ter abraçado alguém com mais carinho sabendo que aquele abraço significaria muito para quem o recebeu. não sou santa, nunca mando ninguém a merda, é verdade; eu os levo pessoalmente.
mas sempre, sempre, acordo sem dormir de uma noite de travesseiro pesado, quando a consciência derruba o corpo. fazer o mal por acaso, como quando alguém tropeça sem querer no nosso pé, é aceitável, são coisas da vida, acontece. mas quando eu coloco o pé para alguém cair, quando eu antecipo a queda e fico lá sentada, apenas observando, eu não aceito, eu não durmo. posso citar o princípio da não-maleficência, posso dizer que a minha falta de ação já é uma ação em si, e que ninguém poderá tudo por todos, posso. mas eu não entendo.
repito, eu já fiz muita coisa errada na vida, errei tentando acertar, errei por prazer da dor alheia, errei a data de um aniversário importante, errei na hora de marcar o gabarito, errei na escolha de palavras, errei na ausência de carinho intencional, errei no julgamento, errei comigo e com os outros, sempre pagando com dias pesados de sono no final, porque se arrepender é uma forma de redenção, aprenda a lição e siga maior, e eu nunca reclamei dos preços impostos por mim mesma no final de todos os erros.
e agora eu não sei justificar essa coisa que nunca senti antes, que me impede de sentir tudo, porque eu não enxergo o erro, eu não entendo o que está acontecendo, só estou sendo sugada para dentro, sentindo minha conta emocional se esvaziando, os números vermelhos de dívidas piscando, e eu não consigo ver com os olhos que buraco enorme é esse que não fecha, que erro absurdo é esse que vale uma vida, a minha.

sentaram no meu peito, apertaram meu coração e disseram: tudo passa.

9.6.10

fim

tchau, vou escrever num caderno vermelho para sempre.

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passe uma tarde comigo e talvez verás meus olhos brilhando por coisa ou outra, entre outras coisas. enquanto te conto meus sonhos e todas as mágicas que inventei para sobreviver até aqui, a gente pode dividir uma xícara de chá ou um copo de cerveja, e talvez você se sinta a vontade para fazer meus olhos brilharem por uma ou outra coisa tua também. eu te darei muito de mim, sem dúvida te darei uma impressão diferente da primeira que havias, e partirás achando que sabes bastante a meu respeito. mas saberás coisa inútil, visto que sou sentida, sou coisa viva, uma dor de várias faces que por vezes sorri também. sou uma e levo várias vidas, todas marcadas pelo mesmo ferro, pelas dores que são, de certa forma, dores tão minhas, e eu tanto sou tais dores, que não há distinção entre coisa e outra, portanto só me conhecendo quem as sente, só as sentindo quem me conhece.

quando já não sinto mais nada, desconheço-me por completo.


o que fazer com as marcas?
porque a dor eu aguento, a dor eu choro, remedio, espero paciente. mas e as marcas antigas, as feridas velhas e secas que não fecham, como é que se faz quando a dor é crônica e o coração idoso? o que é que se faz quando já se fez de tudo e de nada adiantou, quando dos remédios só se teve os efeitos colaterais, das palavras só o áspero, como é que se faz quando o ar passa feito uma lixa nos pulmões e quando tudo por dentro está um caco? eu me sinto um fim de festa, uma âncora sem navio, apenas peso que ninguém tem mãos para segurar, escorro feito a água que me afunda, disparo incoerências e na confusão de remadas, distribuo murros e socos e ponta pés. eu não posso falar nada disso porque minha boca é um pequeno buraco de um dique cheio, e se eu abri-la pra te contar, vou derramar em você tudo que não quero. eu não posso dizer que quero solidão porque busco paz, pois a paz não está em mim. quando eu digo que quero ficar só, não é sua presença que incomoda; é a minha. eu quero solidão para engolir tudo, para chorar com calma, sem perturbar ninguém, pois ultimamente eu tenho sido demais e ainda tem muito. pedir paz é muito, eu só quero evitar as minhas guerras conhecidas e novas feridas velhas.

me sinto aquele sofá velho que vez ou outra avisto boiando no canal; já fui lugar de conforto para uma família.

seco



ao meu pequeno príncipe


A menininha para quem cuidadosamente reservei esse tempo livre nem se deu o trabalho de me avisar que não viria.


Menininha, foi com carinho que lhe dei esse poder. É com melancolia que a vejo usá-lo.


A espera, os passos leves. Depois as horas que correm frescas como um riacho em meio à relva sobre seixos brancos. Os sorrisos, as palavras sem importância que são tão importantes. Escutamos a música do coração: é linda, linda para quem sabe ouvir...


Não gosto da estação interior que substituiu minha primavera: uma mistura de decepção, de secura e de rancor. Mergulho num tempo vazio onde não tenho mais motivo para sonhar. O mais triste num sofrimento é se perguntar: "Vale a pena?"

Vale a pena todo esse sofrimento por quem nem mesmo pensa em avisar? Certamente não. Entao nem sofrimento se tem mais, e isto é ainda mais triste.

Não há Pequeno Príncipe hoje, nem haverá nunca mais. O Pequeno Príncipe morreu. Ou então tornou-se cético. Um Pequeno Príncipe cético não é mais um Pequeno Príncipe. Fiquei magoado com você por tê-lo destruído.

Também não haverá mais carta, nem telefonema, nem sinal. Não fui muito prudente, e não pensei que pouco aos pouco, com isso, arriscava um pouco de sofrimento. Mas eis que me feri na roseira ao colher uma rosa.

A roseirá dirá: "Que importância eu tinha para você?" Chupo meu dedo, que sangra um pouquinho, e respondo: "Nenhuma, roseira, nenhuma. Nada tem importância na vida. (Nem mesmo a vida.) Adeus roseira."

A.

eu também

brown eyes

às vezes eu me assusto com tudo que tu significa pra mim porque eu sei que se um dia tu for embora nada no mundo vai conseguir preencher esse espaço, e às vezes eu me assusto porque eu me pego pensando em tu e querendo me entregar todinha pra tu, e eu tenho medo de terminar vazia e sozinha. acho que isso é medo natural que todo mundo sente, mas eu tenho ainda mais medo pq quando eu to ctg eu não sinto esse medo, e eu me permito me abrir todinha, sem nenhuma defesa, porque tem algo que me diz "aqui não precisa disso". quando eu to ctg eu não meço as minhas palavras, eu não roo as minhas unhas, eu não faço nenhum esforço para ser quem sou, eu não quero estar em nenhum outro lugar com mais ngm. quando eu to ctg a gente pode ta em qualquer lugar, fazendo qualquer coisa, e eu me sinto completa porque o que eu gosto realmente quando to ctg é a liberdade natural que tu me da de simplesmente ser eu.

não me imagino existindo de nenhuma outra forma nem pra mais ngm, e acho que isso é a maior felicidade que alguém pode sentir, a maior fidelidade que alguém pode oferecer.


tu é meu livro preferido.

how my heart behaves

Meu coração é um ideograma desenhado a tinta lavável em papel de seda onde caiu uma gota d’água. Olhado assim, de cima, pode ser Wu Wang, a Inocência. Mas tão manchado que talvez seja Ming I, o Obscurecimento da Luz. Ou qualquer um, ou qualquer outro: indecifrável.



Meu coração não tem forma, apenas som. Um noturno de Chopin (será o número 5?) em que Jim Morrison colocou uma letra falando em morte, desejo e desamparo, gravado por uma banda punk. Couro negro, prego e piano.



Meu coração é um poço de mel, no centro de um jardim encantado, alimentando beija-flores que, depois de prová-lo, transformam-se magicamente em cavalos brancos alados que voam para longe, em direção à estrela Vega. Levam junto quem me ama, me levam junto também.




Meu coração é um bordel gótico em cujos quartos prostituem-se ninfetas decaídas, cafetões sensuais,deusas lésbicas, anões tarados, michês baratos, centauros gays e virgens loucas de todos os sexos.




Meu coração é um entardecer de verão, numa cidadezinha à beira-mar. A brisa sopra, saiu a primeira estrela. Há moças nas janelas, rapazes pela praça, tules violetas sobre os montes onde o sol se põe. A lua cheia brotou do mar. Os apaixonados suspiram. E se apaixonam ainda mais.




Meu coração é um filme noir projetado num cinema de quinta categoria. A platéia joga pipoca na tela e vaia a história cheia de clichês.




Meu coração é uma velha carpideira portuguesa, coberta de preto, cantando um fado lento e cheia de gemidos - Aí de mim! Ai, ai de mim!




Meu coração é o laboratório de um cientista louco varrido, criando sem parar Frankensteins monstruosos que sempre acabam por destruir tudo.




Meu coração é um mendigo mais faminto da rua mais miserável.




Meu coração é um traço seco. Vertical, pós-moderno, coloridíssimo de neon, gravado em fundo preto. Puro artifício, definitivo.




Meu coração é um anjo de pedra de asa quebrada.




Meu coração é um bar de uma única mesa, debruçado sobre a qual um único bêbado bebe um único copo de bourbon, contemplado por um único garçom. Ao fundo, Tom Waits geme um único verso arranhado. Rouco, louco.




Meu coração é um sorvete colorido de todas as cores, é saboroso de todos os sabores. Quem dele provar será feliz para sempre.




Meu coração é uma sala inglesa com paredes cobertas por papel de florzinhas miúdas. Lareira acesa, poltronas fundas, macias, quadros com gramados verdes e casas pacíficas cobertas de hera. Sobre a renda branca da toalha de mesa, o chá repousa em porcelana da China. No livro aberto ao lado, alguém sublinhou um verso de Sylvia Plath: "Im too pure for you or anyone". Não há ninguém nessa sala de janelas fechadas.


Meu coração é um deserto nuclear varrido por ventos radiativos.




Meu coração é um cálice de cristal puríssimo transbordante de licor de strega. Flambado, dourado. Pode-se ter visões, anunciações, pressentimentos, ver rostos e paisagens dançando nessa chama azul de ouro.


Meu coração é uma planta carnívora morta de fome. Faquir involuntário, cascata de champanha, púrpura rosa do Cairo, verso de Mário Quintana, vitrina vazia, navalha afiada, figo maduro, papel crepom e um milhão de etcéteras!



minúsculo ser

eu me achava incompleta, vazia como uma casa sem móveis, dormia no chão de mim. tantas visitas, e pouca presença. tanto vento, e pouco ar; tudo preenchido com fumaça, bolhas de sabão e espaço. foi depois de algumas noites caminhando pelo nada que descobri que tudo estava ali exatamente por não estar, como uma placa de "reservado" numa mesa que espera alguém, e que era o propósito de cada ausência me mostrar uma parte de mim a ser preenchida, como um passo que antecedia meus pés num caminho invisível traçado antes do saber, farejado apenas com o coração. uma vez nesse caminho, a sensação de perdido aos poucos deu lugar à mim, e sem pedir informação à ninguém, resolvi nunca mais parar para sempre. (...)