29.4.14

sonrisas

vejo aos outros numa espécie de demonstração de si mesmos, e me parecem sempre tão contentes em caber em si, naquele espaço delimitado por pele. vejo a mim, como uma babá com mais do que pode lidar, cheia de rompantes e birras que surgem sem tempo de serem esculpidos em algo mais delicado, por vezes aceitável. desejo muitas vezes esses sorrisos contidos que cabem bem nos porta retratos, mas não sei; talvez minhas bochechas doessem.

vazio no peito

foi no dia dezesseis do quinto mês que ela percebeu o botão da blusa faltando. não era nada demais, um botão a menos numa roupa, mas ainda assim inquietou-se. sabia do passarinho no peito e logo tratou de costurar um novo no lugar, fechando com linha vermelha aquela fresta de liberdade. passou a mão nos braços, deslizando pelo torso, até a cabeça; so para ter certeza que ainda estava tudo ali, estático. vestiu a blusa ao avesso, de forma que a costura mal feita ficou virada para dentro, encarando o centro do seu tórax, quase como um desafio misterioso ao que dentro estava. permaneceu estática diante do espelho cercado de fotos que um dia grudara ali, na esperança de ver algo mais nos reflexos diários. levantando os braços sob a testa, fixou os olhos naquele fio vermelho e aguardou, até que viu o emaranhado crescer, crescer, enrolar-se em si mesmo, tramando um ninho. sentiu a linha liquefazer-se, sentiu um molhado quente e uma dor fina, quase bonita; então na batida seguinte, a bicada. e outra. e outra. seguida de outras tantas, até enxergar no cerne daquele caos, um bico dourado, despontando para fora de si, com toda coragem pra nascer. a princípio, caiu no chão estatelado. não piou, não cantou, não esboçou a menor intenção de voo. era um inútil pássaro que não voava. passou a mão decepcionada no meio do buraco que agora se instalara em seu corpo, e pela primeira vez sorriu; podia enxergar o vazio que sentira ali durante todo aquele tempo. apanhou do chão aquela ave frustrada, guardando-a no bolso junto com as chaves de casa e o celular. trocou de roupa e saiu pela porta de trás com um sorriso entalado nos dentes: agora era so questão de tempo novamente.

28.4.14

fdc

deus ajuda quem bebo madruga

27.4.14

e eu

gostava tanto de você.

25.4.14

náusea

o casal que deu as mãos
e deu-se um nó
que não desgruda
se amando
siameses

24.4.14

lista

das pessoas que mais me ensinaram na vida, com palavras ou apenas em vida:

nata
você 

19.4.14

André

na segunda noite o silêncio era
quase impossível
a respiração bucal
o sol quase suprimido
a filosofia suada
pratica a saudade
pratica o amor
sem dó no peito
ele vai.

azul quente

e eu te olhava
cansada
entre um suspiro e outro
gemendo
derrotada
molhada de azul
você me beijava
um cheia
ressaca
o mar avança
um mendigo
pedindo um abraço
a colcha
a cena num monte de gente 
o nó
so mais um passo
não chore
todo mundo choraria
se fosse você.

transa

o olhar distante
e o corpo poluído 
foi ótimo
gozei três vezes


e eu nem quis

17.4.14

castro alves

a vida de esfarela
se esgarça
num segundo de três minutos
se afunila
como tudo que sai de uma mulher
afunilado na pelve
do destino
não é fácil, eu sei
mas também não é
difícil.

castro alves

a vida de esfarela
se esgarça
num segundo de três minutos
se afunila
como tudo que sai de uma mulher
afunilado na pelve
do destino
não é fácil, eu sei
mas também não é
difícil.

sobre o não dito

o que eu queria era te dizer o que tava na cabeça e desceu pros braços
que eu te amo tanto, tanto! acredito em almas gêmeas, mas espero que você não tenha sido a minha, pois não vamos ficar juntas. me faz feliz te ver bem, mas também doi. você foi o mais intenso que já senti, pra todos os sentimentos que senti contigo. queria ouvir que você também sente minha falta, queria poder conversar contigo sobre as coisas que so consigo falar contigo. ficaram em mim presas, se recusam a sair para outros ouvidos, mas to aprendendo a me abrir de novo. espero que você esteja amando um amor que te faça melhor, que te deixe livre e te faça crescer ainda mais como ser humano e mulher. espero que você tenha experiências incríveis ao lado dessa pessoas tão especial que deve ser maria luiza, pois so alguém especial pode sentar no teu banco de passageiro. se você sentir falta minha as vezes, tudo bem, mas não volte atras, siga em frente que lá na frente talvez a gente se encontre pra tomar um café, fumar um cigarro e conversar da vida como velhas conhecidas. nossos planos foram muitos, mas não passaram de planos. realize-se, trabalhe com e por amor, viaje bastante, tire fotos, tente dormir sempre de coração quente. pretendo sair daqui, mas não quero deixar nada para trás, quero recomeçar de onde parei mesmo, em outro lugar, com outra pessoa que ainda não me sinto a vontade pra procurar. estou terminando minha faculdade, tem uma fase completamente nova da minha vida para começar e por enquanto isso basta, seguir nesse caminho, isso basta. o pouco tem bastado e a vida tem me surpreendido em vários outros aspectos. te amo muito, nunca lutei contra isso e ultimamente nem tenho precisado, tem sido paz esse amor, tem sido diferente. era isso que queria dizer todas as vezes que te encontro, mas um abraço basta. siga doce, meu eterno amor.

16.4.14

undertow

i slipped under the undercurrent

andrea

não tenho medo de pedir as coisas, mesmo que seja você, cujo os nãos tem o peso de uma negativa infinita.
pedi dinheiro, ganhei.
pedi um abraço, ganhei.
pedi pra você ser feliz, ganhamos.
sempre vou te amar de múltiplas maneiras, talvez algumas já morreram, mas sempre haverá amor enquanto houver você. 

afraid

i am constantly afraid of things i know nothing about
afraid of things that know everything about me
things im not even sure exist
or ever will
most of all, things that live up in my head or down down down at the well of the heart

13.4.14

mind at large

"Reflecting on my experience, I find myself agreeing with the eminent Cambridge philosopher, Dr. C. D. Broad, "that we should do well to consider much more seriously than we have hitherto been inclined to do the type of theory which Bergson put forward in connection with memory and sense perception. The suggestion is that the function of the brain and nervous system and sense organs is in the main eliminative and not productive. Each person is at each moment capable of remembering all that has ever happened to him and of perceiving everything that is happening everywhere in the universe. The function of the brain and nervous system is to protect us from being overwhelmed and confused by this mass of largely useless and irrelevant knowledge, by shutting out most of what we should otherwise perceive or remember at any moment, and leaving only that very small and special selection which is likely to be practically useful." According to such a theory, each one of us is potentially Mind at Large. But in so far as we are animals, our business is at all costs to survive. To make biological survival possible, Mind at Large has to be funneled through the reducing valve of the brain and nervous system. What comes out at the other end is a measly trickle of the kind of consciousness which will help us to stay alive on the surface of this Particular planet. To formulate and express the contents of this reduced awareness, man has invented and endlessly elaborated those symbol-systems and implicit philosophies which we call languages. Every individual is at once the beneficiary and the victim of the linguistic tradition into which he has been born—the beneficiary inasmuch as language gives access to the accumulated records of other people's experience, the victim in so far as it confirms him in the belief that reduced awareness is the only awareness and as it bedevils his sense of reality, so that he is all too apt to take his concepts for data, his words for actual things. That which, in the language of religion, is called "this world" is the universe of reduced awareness, expressed, and, as it were, petrified by language. The various "other worlds," with which human beings erratically make contact are so many elements in the totality of the awareness belonging to Mind at Large. Most people, most of the time, know only what comes through the reducing valve and is consecrated as genuinely real by the local language. Certain persons, however, seem to be born with a kind of by-pass that circumvents the reducing valve. In others temporary by-passes may be acquired either spontaneously, or as the result of deliberate "spiritual exercises," or through hypnosis, or by means of drugs. Through these permanent or temporary by-passes there flows, not indeed the perception "of everything that is happening everywhere in the universe" (for the by-pass does not abolish the reducing valve, which still excludes the total content of Mind at Large), but something more than, and above all something different from, the carefully selected utilitarian material which our narrowed, individual minds regard as a complete, or at least sufficient, picture of reality. "

12.4.14

hoje

você na areia
e eu me afogando do lado
teu mãe cobre meus pés 

11.4.14

hoje

minha vida 
comprimida
entre o nascer e o por
do sol

comprimido

hoje

uma tarde inteira
daquelas bem diluídas no tempo
chorando com os olhos fixos
num ponto morto 
nada vi

sobre sapos e peixes

boa tarde meus amigos,


aconteceu algo hoje que mexeu bastante comigo e gostaria de compartilhar com vocês. posso não ser a pessoa mais interessada do mundo pela medicina dos livros, mas a medicina humana, o contato, o apego e o respeito com meus pacientes é algo que sempre prezo. acho que a enorme maioria aqui também...


me senti desrespeitada hoje ao entrar na enfermaria de cirurgia e encontrar minha paciente em outro leito, sob outros cuidados. minha paciente que retornou ontem, pela terceira vez, para conseguir sua tão desejada cirurgia. ela que todas as três vezes aceitou quando alguém olhou-a e disse "me desculpe, hoje não vai dar, não temos material". mas ela voltava contente e cheia de esperança, ainda que "faltasse campo"... 


eis então que me dirijo ao residente que me informa que o leito 08 estava reservado hoje para um "peixe do chefe". não, calma; não era apenas o leito 08, mas o leito 09 também, pois era necessária uma enfermaria inteira, após extensa "desintoxicação" do local, para acolher aquele singelo paciente, tão diferente dos outros. lembro de ter estudado doenças e suas diversas gravidades, mas não lembro de ter lido em lugar algum sobre pacientes diferentes de pacientes. ainda assim, vesti a bata e fui lá ver... 


confesso que tudo que senti ao atender o "peixe" foi nojo, e embora a culpa não fosse dele, simplesmente  não consegui engolir a situação (ainda que goste de peixe hahaha), não houve o famoso rapport que aprendemos na faculdade, não me senti confortável ao dar bom dia. lembrava constantemente das inúmeras altas que havia dado naquela semana, das cirurgias abortadas, da cara doente dos doentes me perguntando "mas Dra, não tem um jeitinho? quanto custa esse tal de campo?". fica difícil olhar na cara do paciente da enfermaria ao lado sem se sentir constrangida. fica difícil engolir um delicioso peixe desse após tantos sapos.


fim de papo: nosso peixe recebeu atendimento "patrão" ouro; teve constantemente a presença de todas as gerações de sua família, dentre os quais estavam pai, mãe, madrinha, avó, avô (aos quais fui formalmente apresentada, pois eram em sua grande maioria médicos); teve seus exames solicitados e realizados prontamente, incluindo uma besteirinha de uma AngioTC e um USG do melhor especialista do serviço (preciso mencionar esse nome?); foi "visitado" por médicos de diversas especialidades em sua enfermaria de luxo; e, pasmem, recebeu um kit completo com roupa de bloco e campo! era o milagre dos peixes!! por outro lado eu, ao entrar lá pra dar um feedback pra turma do aquário, saía com cinco informações diferentes sobre o paciente que supostamente estava acompanhando.  


não pretendo fazer nada a respeito, eu não posso fazer nada a respeito. queria so expressar minha indignação, minha tristeza e minha decepção, ainda que ingênua, com meu dia de hoje. espero que saibamos ser generosos no futuro, mas também justos. agora vou voltar ao meu trabalho com essa espinha entalada na garganta.


9.4.14

paraísos artificias

sólido e depois
ar
acompanhado de líquido

enrola
traga
bebe,

um paraíso.

mirella

te vi passar
mordi teu gosto
só de relance

bateram os dentes
clac!

foi quase.

mirella

te vi passar
mordi teu gosto
só de relance

bateram os dentes
clac!

foi quase.

6.4.14

(pausas)

tem uma lacuna entre uma batida e outra 
o silêncio do corpo
a cerimônia 
quando o coração recebe o sangue
poderia ser sempre assim, quieto

(pausas)

tem uma lacuna entre uma batida e outra 
o silêncio do corpo
a cerimônia 
quando o coração recebe o sangue
poderia ser sempre assim, quieto

enter the void

um grande vácuo
preenchido por sons que já passaram 
restando apenas os restos
do que foi dito um dia
intermináveis palavras
vazias de sentido
sendo só som
roendo os ouvidos 
triste ilusão necessária 

5.4.14

animal

my little animal pieces
ripped apart
by human thoughts
oh cant i be enough?
too much brain on this body

3.4.14

mariola

eu não preciso de você; o mundo é duro e o destino não espera,
não é você quem vai me dar na primavera as flores lindas que sonhei no meu verão 

temq

não se encaixa em mim a idéia, ou melhor, a realidade da partida.

foi mesmo

e ontem, deitada na cama esperando o sono, me veio a idéia: você foi mesmo.

sim, tudo aconteceu. tudo mesmo, até o fim. e não adianta mais criar pensamentos em volta de algo que não está mais aqui: a falta fala mais alto: você foi embora. 
acho que me enganei esse tempo inteiro tentando ler as coisas do jeito que eu queria, como se fossem pra mim; mas não são. 
você está com outra pessoa, do mesmo jeito de sempre, mas é diferente; você se deu, dessa vez; foi você mesmo.
você me esqueceu, colocou uma pedra em cima da história, como se fosse um papel em cima da mesa aguardando debaixo de um peso. 
não entendo como sempre erro tanto, como pude me iludir por tanto tempo; você foi mesmo, mesmo. 
vocês são lindas, de verdade. lembro da gente de olhando no espelho juntas, como um casal; imagino que agora o reflexo faça muito mais sentido.
caiu a ficha ontem, bem simples, eu chapada na cama e pronto, assim mesmo: você foi.

1.4.14

oi

amor, eu to doente, não sei quanto tempo ainda me resta, mas também nunca soube, por que isso agora?, você me amaria mais se eu fosse viver menos?, eu vou morrer meu amor, a coisa é tão séria que ninguém sabe quando, mas minha vida vai parar uma hora, eles disseram, ouvi com todas os pelos, eu vou morrer, queria você bem perto, nunca imaginei que isso acontecia com as coisas lindas, todas finitas.

difícil, porém bonito

tenho sentido dores em locais que não existem, tenho sonhado com pessoas que nunca vi, tenho empacado em problemas imaginários, mas a mais recente de todas foi esse buraco que descobri bem atras da nuca, que escorrega pelas costas e cai bem no frio da barriga.

difícil

amor eu sinto a sua falta, e a esperança nem assim morre.
preciso voltar aos remédios, não ta dando mais, não ta dando pra levar a vida com os pensamentos ruminantes, com o frio constante que desce da cabeça, e esse medo, o pior de tudo, o sem hora, o atrasado, o sempre e assustador medo.
os buracos que há tempos não apareciam, as quedas abruptas, um susto no meio do café da manha, um aperto no meio da frase, meu deus isso não é vida, é sobrevivência. 
além da tontura, tem também as fisgadas no corpo, a mandíbula travada, uma dor, um choro preso bem debaixo da língua e um rio entalado na garganta, um rio que flui sem nunca achar um mar, sempre nunca, sempre! 
acordo de noite procurando você, procuro você no instagram, volto pra dormir e não consigo mais sonhar, tudo se repete à noite e acordo pra um dia cheio de mais você, so que eu não quero, eu nem te quero mais, e tudo isso continua assim, sabe? 
não sei porque parei, não sei que estupidez corajosa foi essa, mas nunca é tarde, ainda da pra voltar, da pra colocar tudo de volta na caixa do peito e sorrir novamente pra esperança, pras portas abertas.
me desculpe, puxarei o tapete novamente, até logo.