3.3.16

o parto dinamarquês

as dores não vinham, naquele dia de chuva abafada, conforme esperado. digo que eram esperadas pois nascer dói e naquele dia nada doía, nem mesmo as árvores que balançavam sob o vento, contorcendo-se para ainda serem árvores. há uma regra universal destinada pela própria natureza de que todas as coisas devem ser, embora não saibam que são, cabendo a elas encontrar o que melhor define sua existência ou curvarem-se ao que lhes convém. eu era ninguém, apenas uma mulher sonhando com as mãos apoiadas em um ventre infrutífero, laico, deserto. o abandono que me causei foi tão grande que fui obrigada a criar uma outra vida. no mais profundo do oceano, perto da trincheira das Marianas, guardei uma palavra nascida, fazendo refúgio num lugar totalmente inacessível. pois havia de ter uma outra vida, simples assim. ainda que longe, impossível e inalcançável.

Nenhum comentário: